País de Poetas IV
Sobre os tremós cintilavam os pingentes dos candeeiros onde se derretiam as velas. Um largo espelho de caixilho de esmalte branco com filetes de oiro reflectia aquela reunião, os homens medonhos, com coletes acolchoados, e que falavam, preguiçosamente, das finanças e de política, as santas criaturas que cochichavam agravos de parentela e de criados, empinando pelas ventas dedadas de rapé. Isidra entrou na sala, mordiscou uma cavaca, chegou-se ao piano, onde apoiou o indicador, experimentando uma escala. "Vida estuporada!" - disse. O fidalgo de Lago, negro como um moiro e que explicava o loiro luminoso dos filhos pelo processo de lhes banhar a cabeça com cerveja quando nasciam, observou-a de través. Odiava os de Borba, parentes seus, rivais na opulência das casas, na excentricidade, nas espaventosas histórias de cavalos e de mulheres. "Famoso ninho que tais pegas dá" - falou, para si, como costumava dizer, com essa espécie de espírito que era como um atributo da sua cólera. Isidra captou a frase, sem a ouvir. Quando, logo depois, ele lhe perguntou, com um ressaibo de velha galantaria, quase lânguido, se ela gostava de versos, Isidra disse-lhe, com uma arrogância fria, sem mesmo o olhar:
- Versos? Meta-os pelo rabinho acima...
A Sibila, Agustina Bessa Luís
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