Esquiringuindum - Crónicas do Brasil III
Das eleições no Brasil, poder-se-ia fazer um blogue inteiro. Quanto mais não fosse, um blogue cómico dedicado a uma série de candidatos absolutamente surreais que concorreram em todos os estados. Haveria lugar para posts sobre a ausência de Lula no debate e/ou da sua ausência de ideias para debater, da sua alegada falta de conhecimento sobre toda a corrupção que o rodeia e da normalidade com que a intelligentsia local a justifica considerando-a uma inevitabilidade.
Da noite eleitoral, poder-se-ia falar do sofisticado sistema de "apuração", da emoção e da sua inexistência nos principais canais que continuaram a programação normal com interrupções a cada meia-hora com os últimos números e muito pouco debate.
Mas eu retive duas coisas: da noite de ontem. A primeira foi um país dividido entre o norte e o nordeste do apoio social e o sul e o sudeste do desenvolvimento económico. Algo novo numas eleições presidenciais no Brasil. Metade do país quer distribuir riqueza, a outra metade acha que primeiro tem de a gerar.
A segunda não tem nada a ver com as eleições - ou talvez tenha tudo. No programa da noite de uma das televisões generalistas, entre interrupções com resultados, fiquei a conhecer um casal que vivia em São Paulo há dez anos e que tinha um desejo que o programa de televisão se propunha realizar. Ambos desempregados e com dois filhos, viram desfeitos os seus sonhos de uma vida melhor na metrópole e só queriam voltar para a Paraíba, mas estavam presos na favela há anos porque não tinham dinheiro nem para o autocarro de volta. O pouco que ganhavam em biscates era gasto na alimentação das duas crianças que têm. Obviamente, entre muitas lágrimas, a televisão patrocinou o regresso à Paraíba e o reencontro com a família que não viam há uma década vivendo no mesmo país.
Na segunda volta, são milhões de vidas como estas que estão em jogo: os brasileiros decidem se precisam de empregos ou de subsídios.
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