"Quid Rides? De te fabula narratur." Horácio.

domingo, outubro 17, 2004

Rocco

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A nomeação de Rocco Buttiglione continua a dar que falar e já causou a divisão dos blasfemos.
Indo por partes: discordo de tudo o que o Buttiglione diz e professa. Acho que a sua escolha está longe de ser inteligente em termos políticos, mas a inteligência é algo que não se pode apontar ao governo italiano nem às negociatas bruxelloises. Acontece que como democrata e liberal tenho de defender a sua nomeação.
A ideia apontada por Vital Moreira que Rocco vai "impor os seus valores religiosos a todos por via de lei" é um absurdo que nem um eurocéptico como eu pode aceitar. É certo que a União vai mal, que as instituições - a começar pelo Parlamento - não são um modelo de funcionamento democrático, mas um Comissário italiano conseguir impor valores religiosos à União é histeria só justificada por falta de argumentos racionais. O próprio até disse, referindo-se à homossexualidade, que embora achasse que era um pecado não o poria em lei. Não precisava de ter dito. Não tem esse poder, ninguém lho deu.
As convicções pessoais, quaisquer que elas sejam, não podem ser impeditivas da ocupação democrática de cargos públicos. A triagem é inevitavelmente censória e antidemocrática. A repugnância que as ideias do senhor causam a CAA e a mim próprio não nos dão o direito de o discriminar com base nelas. Porque é de discriminação que se trata: ninguém o acusou de não ter capacidades para o cargo, presumiu-se que devido às suas convicções não as teria. Ora isto é perigosíssimo e iliberal : é o julgamento das pessoas não pelo seu valor e pelos seus actos, mas pelas suas crenças.
Finalmente, o problema mais grave desta nomeação é o mesmo de todas as outras: ser uma nomeação. Ninguém elegeu o Sr. Barroso nem a sua equipa. O Sr. Buttiglione não pôs as suas ideias à consideração dos europeus para manifestarem o seu acordo ou desacordo - e eu até apostava que a mandar as mulheres para casa não ganharia eleições. Nem em Itália.